Estado de Coisas?
Tudo Fora da Linha!


“Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos de uma vez na mesma sala de jantar.”

GUERRA JUNQUEIRO, 1896




4 de Outubro de 2015... dia de decisões... os três grandes estavam destinados a pisar os relvados (ou assim se esperava, o Benfica acabou por não jogar graças ao nevoeiro) e as pessoas, pelo menos algumas, rumariam às mesas de voto de todo o país.

Os mais antigos com toda certeza lembram-se da Gata Borralheira... nos dias que correm a pequenada parece desconhecer essa figura... diga-se que muitos a esqueceram graças às inúmeras adaptações do universo Disney que preferiu sempre o termo Cinderella ou Cendrillon.

Mas e perguntam vocês... e bem, o que têm um conto supostamente infantil a ver com as eleições legislativas do passado dia 4, com a nova organização do parlamento e com o futuro governo?

A resposta é simples: TUDO!

Cavaco- madrasta

“O grande derrotado destas eleições é uma espécie de Cinderela com quem toda a gente quer casar”

MIGUEL SOUSA TAVARES

E como por enquanto não se paga aqui fica uma...
Sugestão Cultural: 

UM POVO RESIGNADO E DOIS PARTIDOS SEM IDEIAS

Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora , aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem um rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como  que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. 

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente tornado absoluto pela abdicação unânime do País.  

A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.

Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos de uma vez na mesma sala de jantar. 

GUERRA JUNQUEIRO, 1896



Eis uma rubrica onde vos dou a conhecer quer através de declamação ou de transcrição de textos alguns poemas que considero interessantes, loucos e até por vezes parvos... pois afinal de contas, Poesia Precisa-se!





Desde tenra idade que as histórias e as «estórias» sempre despertaram em mim uma curiosidade e um interesse aguçados, devo mesmo confessar que sempre fui ávido de história, mas não uma história qualquer, uma história com «H» grande. A história que poucos sabem, mas que todos deviam saber, falo pois da história mundial, e sim sou daqueles que entende que um estudo e uma reflexão aprofundados da história podem fazer um futuro diferente! 

 Em Setembro de 2010 chegava ao Reino Unido através da televisão privada ITV, uma série de inspiração histórica que estava ainda longe de chegar a Portugal, de seu nome, Downton Abbey, a série foi um estrondoso sucesso de audiências e foi rapidamente difundida por todo o globo, todavia só chegaria a Portugal de maneira acessível a todos, em Fevereiro de 2012 através do canal generalista, SIC. Devo confessar que me causa alguma estranheza uma serie deste calibre ser transmitida a horas que considero proibitivas. Um Sábado às duas da madrugada e num domingo pelos mesmos horários, não são no meu entender horários dignos. Felizmente para uns, a FOXLife, para quem tem a sorte de possuir canais por cabo, tinha já iniciado as transmissões da mesma em Outubro de 2011, sensivelmente um ano depois da sua estreia no Reino Unido. 

 A televisão não é boa nem má, depende do uso que se faça dela, acho que televisão deve ser um meio pelo qual as pessoas consigam retirar algum tipo de ensinamento, fazer reflexões e divertirem-se, acima de tudo divertirem-se, mas porque não juntar ao agradável, é perfeitamente possível, rirmos, chorarmos, pensarmos e até aprendermos com um programa televisivo, se bem que nos dias que correm isso possa ser cada vez mais raro, mas no entanto Downton Abbey é um programa desse género. 

 A série criada por Julian Fellowes, é uma busca constante pelo retrato «histórico» da típica aristocracia britânica do início do século XX. Downton, é uma gigantesca propriedade (fictícia) que pertence há várias gerações à família Crawley, sendo o seu atual proprietário, Robert Crawley, conde de Grantham (Hugh Bonneville). A série começa com acontecimento duplamente trágico, trágico para milhares de pessoas que perderam as vidas no TITANIC em busca de uma vida melhor, e trágico para Robert Crawley pois perde o seu herdeiro que viajava a bordo do navio, um primo que ele pretendia ver casado com a sua filha mais velha Mary Crawley (Michelle Dockery), mas rapidamente nos esquecemos disso, pois em Downton os acontecimentos são vertiginosos e a esperança de não perder a propriedade por não ter um filho homem, volta para Robert quando este toma conhecimento da existência de um primo afastado, Mattew Crawley (Dan Stevens) Mattew é um jovem advogado que vive em Manchester e se vê assolado pela perspetiva de uma vida «nova». Para Mary, o seu potencial noivo é demasiado classe média e para Violet Crawley, a condessa viúva (Maggie Smith), é simplesmente bizarro, uma vez que o individuo em questão usa termos que para ela são absolutamente desconhecidos e vem de uma realidade um tanto ou quanto diferente daquilo a que está habituada. Para ela a ideia de fim de semana, não consta do seu dicionário ou falar-se de dinheiro à mesa é inconcebível, ora comparem com os dias de hoje… 

 No entanto apesar de todo este aparato familiar e todo glamour representado pela família rica que pouco mais tem que se preocupar do que em assegurar as suas possessões, e manter as aparências, o que mais me cativa em Downton é o facto de coexistirem num mesmo universo, duas realidades distintas que se encontram e desencontram no espaço físico, o gigantesco castelo onde todos habitam. São duas realidades paralelas: a parte Superior do Castelo (Upstairs), aqui os “senhores” levam a sua típica vida e costumes de nobreza, uma vida repleta de luxo e sumptuosidade; e a parte Inferior do Castelo (Downstairs), no andar inferior as coisas são bem diferentes, a «criadagem», aqueles que servem o andar superior laboram para o normal funcionamento de toda a gigantesca engrenagem que põe a casa a funcionar, o Mordomo, a Governanta, criadas pessoais, criadas de servir, lacaios, motorista, cozinheira, é este o universo deles e é aí que se sentem bem, tem até orgulho em servir quem servem como se fosse a sua verdadeira família. 

 Duas realidades diferentes, mas que quase que tocam, pois a intriga, maledicência e os esquemas para de alguma forma atingir os fins pretendidos acontecem em ambos os andares. A principal diferença é que apesar de tudo aqueles que não têm luxos e vivem com imensas apoquentações diárias preocupam-se com os que moram no andar de cima e para esses os de andar de baixo não passam de «invisíveis» que devem fazer o seu trabalho. 

A narrativa da serie é elegante, envolvente e cativante, disso não me restam muitas dúvidas, mas é a junção de ficção com factos ou acontecimentos históricos que lhe dá credibilidade, é exatamente isso que a torna tão especial, a possibilidade de como um acontecimento que supostamente é de conhecimento geral pode alterar o rumo dos personagens e de todo o enredo. A narrativa da 1ª temporada foca ao longo dos sete episódios, dois factos de relevância histórica, o já mencionado naufrágio do TITANIC em 1912 e o anúncio da 1ª Guerra Mundial em 1914 (último episódio da temporada). 

 A série evoluiu e encontra-se agora em exibição, cinco anos depois a 5ª temporada, muito se passou desde a narrativa que em 1912 tinha preocupações triviais, Downton enfrentou durante esse período correspondente a 12 anos (a 5ª temporada decorre em 1924), uma guerra mundial, evoluções no campo da medicina, avanços tecnológicos como a chegada da eletricidade e do telefone ao grande castelo, a rádio também marca presença e os novos estilos musicais como o Jazz são também abordados. Downton não é de todo uma aula de história, mas de maneira muito subtil consegue transmitir a quem a vê uma serie de conhecimentos de ordem histórica e sociológica. 

 Downton pode até cair em alguns estereótipos e clichés novelescos e tem defeitos como todas as séries, os vilões, os puritanos, os ricos, os pobres, os escândalos e as festas. Mas é inegável que a sua qualidade é acima da média. Tem um argumento muito bem elaborado, ótimos cenários e figurinos magnificamente executados. No que diz respeito à qualidade interpretativa dos atores envolvidos, confesso que o elenco é regular e homogéneo em relação à sua prestação, o destaque vai na minha opinião para Maggie Smith, a veterana atriz britânica tem um desempenho notável, «roubando» as cenas em que aparece, com uma personagem mordaz, engraçada e zelosa dos princípios da aristocracia vitoriana, tem das falas mais hilariantes e bem colocadas de toda a série. (a sua prestação já lhe valeu dois emmys, dois Screen Actors Guild Awards e um globo de ouro). 

 A crescente popularidade que Downton assumiu fez com que atores e atrizes que são habitualmente associados ao cinema americano, participassem na série, são os casos de Shirley MacLaine (que deu vida a Marta Levinson, mãe de Cora Crawley (Elizabeth McGovern), mulher americana de Robert), Paul Giamatti (Harold Levinson, irmão de Cora Crawley) e recentemente George Clonney num episódio especial de natal. 

 Se gostam de história, de intrigas e de um humor requintado esta é uma série para vocês, em cinco temporadas têm muito com que se entreter! 

 Downton é sem qualquer dúvida uma série com História…